Como Cassio Rippel, melhor do
Brasil na modalidade, se prepara para os Jogos
A concentração total, a perfeita
técnica mecânica, a precisão calculada e o instinto automatizado para execução
dos movimentos reproduzidos dezenas de vezes, em intervalos de menos de um
minuto. Aparentemente simples, o tiro esportivo é uma modalidade olímpica que
contempla uma complexa gama de variáveis. Para chegar o mais próximo possível da
repetição sistemática de gestos, o paranaense de Ponta Grossa Cassio Rippel,
major do Exército de 37 anos, chega a dar 300 disparos diários no período de
treinos.
— A rotina é muito importante.
Qualquer bom atirador pode fazer um 10, dar um tiro perfeito. O que diferencia
um campeão olímpico é que ele faz isso 100, 120, 150 vezes. É a constância —
explica. — É uma luta para massificar o movimento, que meu corpo saiba fazer
quase “sem pensar”. Ser algo instintivo.
Embora vá disputar também a
categoria Três Posições (disparos em pé, deitado e ajoelhado) nas Olimpíadas,
Cassio é especialista na Carabina Deitado 50m. Ele foi finalista de cinco
etapas da Copa do Mundo nos últimos anos e campeão no Pan de Toronto, derrotando
Michael McPhail, dos Estados Unidos, atual número 1 do ranking.
Basicamente, são três tipos de
variáveis que determinam o tiro perfeito: a parte mecânica, ou seja, a técnica
de posição do corpo, controle e contato com a arma e a mira; os fatores externos,
como luminosidade do alvo, temperatura e clima do local de disputa; e a parte
mental, imprescindível para o foco inabalável — nesta categoria, cada atirador
dá 60 tiros em 50 minutos, e os oito melhores vão para a final, em que cada um
dispara mais 20 vezes.
Cássio conta que disputava
competições internas das Forças Armadas desde 1995, e passou a se dedicar
fundamentalmente ao esporte profissional desde o Pan de 2007. Foi neste mesmo
ano que tomou a decisão que transformou sua carreira: conseguiu aprovação para
ser treinado por David Johnson, técnico da seleção olímpica de tiro dos Estados
Unidos na cidade de Columbus, no estado da Geórgia. Ele permaneceu lá durante a
“Spring Selection”, a acirrada seletiva do time americano para os Jogos de
Pequim-2008.
Foi um divisor de águas em sua
trajetória. Ali, aprendeu os fundamentos da modalidade: achou sua melhor
posição do corpo, os pontos de contato da cabeça com a carabina, as técnicas de
mão direita (a do gatilho) e mão esquerda (que sustenta a arma). Uma mínima
variação compromete o tiro:
— Antes, eu treinava por
tentativa e erro, não havia uma referência técnica de carabina no Brasil. Lá,
senti que entrei num rumo certo. Antes, a cada pequena variação de posição do
corpo ou de uma mão, eu perdia dois meses até perceber que não ia dar certo.
Simplesmente não haveria tempo para evoluir se seguisse naquele método
empírico. Os fundamentos não mudam, é preciso aprendê-los, mas cada um encontra
um detalhe ou outro que se adapta melhor. Isto é só a técnica de posição e
tiro.
NA TRILHA DE PARAENSE
O sonho agora é que a presença
dos Estados Unidos seja tão decisiva quanto foi para o atirador Guilherme
Paraense, primeira medalha de ouro do Brasil na história olímpica. Nos Jogos de
Antuérpia — na Bélgica, em 1920 —, o tenente do Exército Brasileiro atirou com
armas cedidas pela delegação americana, que se solidarizou com a delegação
brasileira, roubada no trajeto entre Bruxelas e Antuérpia. O gesto permitiu a
Paraense conquistar ouro na pistola rápida e bronze por equipe na pistola
livre.
— (Paraense) É o maior
inspirador. Em Campinas, nosso polígono de tiro leva seu nome, tem o busto
dele. É um nome histórico, cultivado e valorizado — comenta Rippel, formado na
Academia Militar das Agulhas Negras. — O esporte olímpico, de alto nível, é uma
coisa. Mas o dever de todo militar é atirar bem. Para nós, nunca será um hobby;
é uma obrigação, um dever.
Rippel salienta que a parte
mental é tão importante quanto, e indissociável da preparação física. Na carabina
deitado, o ombro direito, para os destros, é uma região muito exigida, pois
recebe o impacto do recuo da arma, de força igual ao impulso do projétil para a
frente. A estabilidade do corpo por um longo período na mesma posição é outra
necessidade de bom condicionamento.
A SOLIDÃO NA LINHA DE TIRO
É também o bom preparo físico,
aliado à força mental e capacidade de concentração, que pode levar a atingir o
objetivo perseguido por todo atirador: executar a prova, mesmo na tensão de uma
final olímpica, com o batimento cardíaco o mais baixo possível. Feitas as
contas, sobra um intervalo de menos de um segundo entre uma pulsação e outra do
coração para apertar o gatilho:
— São 60 tiros em 50 minutos,
mais de um por minuto. Se você consegue ter uma frequência cardíaca baixa, por
volta ou pouco acima dos 60 batimentos por minuto, no máximo 90, você tem
espaço de quase um segundo, para atirar entre uma batida e outra, que é o
momento certo. Se você está nervoso e a frequência aumenta, isso se reflete. O
controle da arma, tanto com a mão do gatilho quanto com o apoio da carabina, é
sensível, e isso interfere.
Estar psicologicamente forte é
também importante porque o tiro esportivo é essencialmente solitário. Cada um
faz a sua performance sozinho, soma seus pontos e os melhores vão à final.
— Não jogo exatamente contra o
outro. Não tenho como atrapalhar ninguém, impedir o adversário, como em outros
esportes. Ali na linha de tiro é meu mundo, ninguém pode me incomodar. O alvo
está lá, a 50m de distância, a 75cm acima da mira da minha arma. Assim é para
todos.
O retrospecto recente de bons
resultados leva Cassio a se permitir imaginar até mesmo um pódio no Rio:
— Os 30 primeiros (do ranking)
têm chances, dentre estes, são uns 10 de primeiro nível. Cada prova é no
detalhe. As condições do estande (luminosidade, vento) aumentam a incerteza.
Passando para a final (oito melhores), zera tudo.
Leia mais sobre esse assunto em
http://oglobo.globo.com/esportes/por-dentro-do-tiro-esportivo-ate-batimento-cardiaco-influi-na-prova-18439855#ixzz3x3twtgZX
por Miguel Caballero
Por: oglobo.globo.com
Postado por Thom Erik Syrdah
Blog – Tiroolimpico,blogspot.com.br
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